quinta-feira, 17 de maio de 2018

NEGROS NÃO SÃO

Oncotô? Doncovi? Proncovô? O princípio da existência está baseado menos nas respostas e mais na convivência com as perguntas. No entanto, sempre é importante lembrar que a ideia de negro está desvinculada de humanidade, logo, ao contrário do que deveria ser para todo mundo, a existência negra tem sempre que se justificar.

Childish Gambino fez um clipe icônico que fala bastante por si, embora a repercussão do vídeo tenha acontecido menos pelas reflexões decorrentes do que é mostrado e mais pelas explicações sobre o que significa cada elemento. Foi como se o público estivesse brincando de "Cadê o Wally?" para inserir notas de rodapé.

Não que seja errado buscar referências do clipe caso haja maior interesse, mas qual foi a última vez que vimos fenômeno semelhante? Gambino não é o primeiro artista a fazer um clipe cheio de referências, mas a ânsia em explicá-las também fazem parte do mundo que ele representa no vídeo.

A alforria fazia parte do sistema escravista tanto quanto as correntes e os troncos, mas costuma ser mais ignorada. Ora, um sistema que forja um termo capaz de dizer que "alguém 'deu liberdade' a alguém que não é alguém" só poderia produzir uma sociedade onde um artista, pelo fato de ser negro, tem que explicar sua arte como se tivesse feito algo errado.

Repercussões desse tipo evidenciam que "ser" é proibido para nós nesse mundo. Não há outra saída senão aproveitar oportunidades como essa para questionar e combater a tutela racista que a alforria cravou sobre a liberdade dos negros. Somos livres, somos gente, Somos.

Destaco um trecho de uma entrevista em que Donald Glover, diante da insistência do jornalista, afirma que não é papel dele dizer qual é o sentido do clipe. Com isso ele afirma a própria liberdade artística de poder criar sem explicar intenções.