terça-feira, 19 de janeiro de 2016

PERSPECTIVAS SOBRE A UNICAMP

No final do ano passado participei da chapa "Tô Vendo Uma Esperança" nas eleições para DCE da Unicamp. O texto de apresentação da nossa carta-programa ficou sob minha responsabilidade e, apesar de não ter ficado completo, gostei muito do resultado, pois sintetiza muito do que acumulei sobre Educação, Universidade, Movimento - e sobre a Unicamp. Leia a seguir. ---

APRESENTAÇÃO

O Brasil e a Educação

A Educação agrega o legado do passado, as tarefas do presente e as perspectivas de futuro de um país. Por isso é um tema de preocupação central em qualquer lugar do mundo.

A política tradicional brasileira sempre encarou a Educação como um instrumento de controle de poder para poucos e não como mecanismo de transformação social. Também por isso, sempre foi alvo de políticas retrógradas, restritivas e elitistas.

Esse entendimento ajuda a pensar porque o Brasil - que tem um passado colonial, imperial e republicano tão marcado pelo autoritarismo, exploração e abandono de seu povo - tem tantas tarefas no presente para encontrar a igualdade, a democracia, o desenvolvimento.

Trilhamos os caminhos da defesa da Educação enquanto forma de construção de um país justo e soberano.

Projeto Político de Universidade do Brasil

A universidade é fundamental para que essas transformações ocorram, por isso sempre foi negada à maioria da população e restrita a uma elite incapaz de pensar os problemas da realidade brasileira.

Nos últimos anos houve a expansão e democratização do ensino superior, mas muito aquém do que realmente era necessário. A expansão aconteceu sem qualidade e a democratização, pela metade.

Além disso, o interesse do capital cresceu e atualmente hegemoniza o Ensino Superior, submetendo os estudantes à reprodução da lógica do lucro e não da busca por emancipação.

Tudo isso enquadrado num projeto político de universidade que tentou conciliar os interesses do povo e da elite. Não acreditamos nesse tipo de arranjo e seguimos defendendo um projeto global de universidade pautado nos interesses populares.

A qual interesse serve a Unicamp?

A Unicamp é uma das principais universidades do país - e não é só pelos rankings em que se consagra nas primeiras posições, mas porque sua produção é estratégica para várias áreas da política, do desenvolvimento econômico e social. Mas a quem serve a produção da Unicamp?

Ao longo dos últimos anos a universidade tem reforçado a tendência nacional e internacional de ceder seus espaços para empresas privadas, sejam eles físicos (laboratórios privados) ou institucionais (financiamento de programas e projetos e interferência nos currículos).

Além disso o sucateamento e a "crise orçamentária", que tem servido como justificativa para a cobrança de mensalidades e, como objetivo principal, sua privatização, têm em comum o ataque ao interesse público que a universidade deve representar e ao direito da população ao Ensino Superior.

A Unicamp, portanto, serve a poucos. A tarefa histórica colocada a partir daí é reverter essa direção para o interesse de todos e a mudança de projeto político é central para que isso aconteça.

Projeto Político da Unicamp e Democracia Interna

A dificuldade de mudar essa situação reside no fato de que o espaço destinado para essas formulações é reflexo do que está vigente.

O projeto de universidade adotado pela Unicamp diz respeito também à sua democracia interna. Qualquer instância de decisão segue a proporção de 1/5 para estudantes, 1/5 para funcionários e 3/5 para professores. Em outas palavras, decisões importantes que afetam a qualidade do ensino, pesquisa, extensão e serviços em geral são tomadas pelos últimos; as demais categorias têm peso simbólico.

Tendo maior poder de decisão, maior é a responsabilidade dos professores pelos destinos que a instituição vem tomando ao longo do tempo e, notadamente, as prioridades assumidas não representam as demandas reais do conjunto da comunidade acadêmica.

A chamada "crise orçamentária", por exemplo, tem sido usada internamente há anos para negar a isonomia salarial aos funcionários, mas não para vetar a compra da Fazenda Argentina ou extinguir os supersalários. Esses e outros casos comprometem a saúde da universidade e são a expressão de um poder concentrado.

Por isso a paridade em todas as instâncias deliberativas da universidade é fundamental para que outra direção seja tomada. A democracia interna deve ser revisada de forma a distribuir o poder decisório entre estudantes, funcionários, professores e comunidade externa. Queremos discutir e decidir sobre os problemas e rumos da universidade em pé de igualdade!

Projeto Político da Unicamp e Modelo de Acesso

A composição social da Unicamp em seu corpo discente, funcional e docente reflete seu gritante projeto elitista.

No que diz respeito ao ingresso na graduação, o vestibular ainda é adotado como modelo, na contramão de universidades públicas do país todo que têm adotado o ENEM como processo de seleção mais barato, abrangente e democrático.

A meritocracia continua sendo usada para justificar o método e a aversão às cotas de escola pública e raciais, mas esconde o real interesse pela exclusão de negros, indígenas e egressos do ensino público. Também é necessário pontuar que atualmente a prova "nacional" não acontece em todas as regiões do país.

Além de pública, gratuita e de qualidade, defendemos que a Unicamp tenha a cara de seu povo e isso passa necessariamente por um processo de democratização do acesso. O ENEM aliado a uma política de cotas raciais proporcionais à população do estado deve ser adotado como modo de ingresso na graduação.

O Movimento Estudantil

Historicamente a organização política se confirma como melhor instrumento de reivindicação. Ela se apresenta ao mesmo tempo como necessidade e método para agir na política, afinal, a política é o espaço legítimo de disputa de forças. Dessa forma, o Movimento Estudantil é a expressão da organização protagonista dos estudantes na luta por direitos.
O voto que disputamos nessas eleições é uma parte do que representa o conjunto dessas expressões em movimento. Entretanto, como consequência de anos de burocratização, é tido como o principal.elemento em detrimento de práticas mais ousadas, criativas e eficazes.

O Movimento Estudantil da Unicamp

O ME da Unicamp se inscreve nesse processo. Há doze anos sob uma gestão burocrática, sectária e desconectada da comunidade estudantil e há um ano sob outra mais burocrática, mais desconectada e que se esconde em momentos importantes o que constatamos é o esvaziamento dos espaços, a perda de credibilidade e sua consequente desmobilização.

Não nos reconhecemos nem compactuamos com as práticas centralizadoras e burocratizadas das gestões anteriores, que só contribuíram para o esvaziamento dos espaços.

Defendemos um movimento mais representativo e menos burocratizado, atento às demandas dos estudantes e suas novas linguagens e práticas. O DCE deve ser um espaço autônomo, de diálogo, articulação e mobilização dos estudantes; não deve se negar a tratar assuntos da comunidade acadêmica com a Reitoria, mas não deve ser condescendente com seus desmandos; deve, também, superar as cercas impostas pela Unicamp e ser aliado dos movimentos sociais em suas lutas na cidade, no estado e no país.

Há uma esperança

Os componentes que apresentamos até agora são uma parte da nossa leitura dos problemas do Brasil, da Educação, da Unicamp e do Movimento Estudantil. As tarefas não são poucas nem fáceis, mas acreditamos que com organização, propostas e luta política é possível cumpri-las.

Reconhecemos o papel decisivo da universidade e consideramos importante ocupá-la não somente como estudantes passivos, mas agentes de transformação da cultura, da sociedade, da política.

Somos uma chapa que acredita, defende e luta por uma Unicamp pública, gratuita e de qualidade. Também assumimos nessa bandeira histórica o caráter popular e democrático que a Unicamp precisa e o conjunto da sociedade exige.

Nessas eleições para DCE estamos todas e todos vendo uma esperança! Uma esperança em um movimento compatível com a realidade e as lutas dos estudantes.

Identidade visual da chapa "Tô Vendo Uma Esperança" para DCE da Unicamp 2016. O nome e logotipo da chapa são inspirados no trabalho do cartunista Henfil às vésperas da fundação do PT.